quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 07.02.2012

Insolvência culposa
Presunção juris et de jure
Efeitos

“I – A impossibilidade de o devedor solver os seus compromissos, o que caracteriza o estado de insolvência, pode ser meramente casual, ou fortuita e culposa, lato sensu (artº 185 do CIRE).
II - A insolvência é culposa quando esse estado tiver criado ou agravado em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência (artº 186 nº 1 do CIRE).
III - A qualificação da insolvência como culposa reclama, portanto, uma conduta ilícita e culposa do devedor ou dos seus administradores.
IV - A ilicitude do comportamento do devedor ou dos seus administradores reparte-se por elementos objectivos e subjectivos.
V - A culpa do devedor ou dos seus administradores decorre de um juízo de censurabilidade, em cuja formulação devem ser consideradas as condições que justificam que lhes seja dirigida essa censura.
VI - A censurabilidade da conduta é uma apreciação de desvalor que resulta do reconhecimento de que o devedor, ou os seus administradores, nas circunstâncias concretas em que actuaram, podiam ter conformado a sua conduta de molde a evitar a queda do primeiro na situação de insolvência ou agravamento do estado correspondente.
VII - A censurabilidade do comportamento do devedor ou dos seus administradores é um juízo feito pelo tribunal sobre a atitude ou motivação de um e de outros, segundo o que pode ser deduzido dos factos provados.
VIII - A lei considera sempre culposa a insolvência do devedor, que não seja pessoa singular, designadamente quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham destruído ou descaminhado, no todo ou em parte, o património do devedor ou tenham incumprido em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada (artº 186 nº 2 a) e h), 1ª parte, do CIRE).
IX - Trata-se, nitidamente, de uma presunção absoluta, inilidível ou iuris et de iure, dado que impõe um regime, não admitindo prova em contrário (artº 350 nº 2, in fine, do Código Civil).
X - As consequências da declaração de insolvência caracterizam-se pela patrimonialidade.
XI - Porém, no caso de qualificação da insolvência como culposa, aos efeitos patrimoniais da declaração de insolvência podem somar-se efeitos pessoais, quer relativamente à pessoa do devedor – se for uma pessoa física ou singular – quer no tocante aos administradores do devedor, quando este não tenha aquela qualidade.
XII - Efeitos que atingem logo direitos fundamentais e mesmo direitos fundamentais que têm por objecto bens e direitos de personalidade.
XII - A qualificação da insolvência como culposa implicava irremissivelmente duas consequências principais para o sujeito que devesse ser afectado por essa qualificação: uma inabilitação temporária; uma inibição temporária para o exercício do comércio e de certos cargos (artº 189 nº 2 b) e c) do CIRE).”

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